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Documento Oficial da SUFU sobre Medicamentos Anticolinérgicos para Bexiga Hiperativa e Risco de Demência

Autores do Artigo: 

Jacqueline Zillioux, Blayne Welk, Anne M. Suskind, E. Ann Gormley, Howard B. Goldman

Journal

Neurourology and Urodynamics

Data da publicação

Outubro 2022

Autor do Resumo

Editor de Seção

  

Introdução

Os medicamentos anticolinérgicos são amplamente utilizados no tratamento da bexiga hiperativa (BH) e para sintomas vesicais pós-cirúrgicos. No entanto, há um crescente corpo de evidências que sugere uma associação entre o uso desses medicamentos e um aumento no risco de demência. Considerando a inexistência de cura para a demência e a importância da prevenção e redução de riscos, a Society for Urodynamics, Female Pelvic Medicine, and Urogenital Reconstruction (SUFU) reuniu um comitê de especialistas para analisar e contextualizar o conhecimento atual sobre os riscos cognitivos associados aos anticolinérgicos na população urológica, fornecendo orientações clínicas práticas sobre o tema.

Objetivo

O objetivo deste documento foi contextualizar a compreensão atual sobre os riscos cognitivos dos medicamentos anticolinérgicos em pacientes urológicos e fornecer orientações clínicas práticas para a prescrição desses medicamentos, dada a associação entre o uso crônico e o risco de demência.

Desenho do estudo

Documento oficial (white paper) baseado em revisão da literatura especializada e na opinião de um comitê de especialistas, com aprovação do conselho da SUFU.

Materiais e Métodos

O documento foi elaborado a partir de uma revisão exaustiva da literatura científica e do consenso de um comitê de especialistas. As declarações e recomendações contidas no documento refletem a opinião desses especialistas, baseada nas melhores evidências disponíveis. O processo incluiu a revisão e aprovação pelo conselho da SUFU para garantir a validade e relevância das orientações.

Desfechos

Os desfechos deste trabalho são as seis declarações principais e as conclusões do comitê de especialistas sobre o uso de anticolinérgicos para BH e o risco de demência.

Resultados

O documento da SUFU apresenta as seguintes declarações e achados principais:
  • Uso Crônico e Risco de Demência: O uso crônico (acima de 3 meses) de medicamentos anticolinérgicos para BH está provavelmente associado a um aumento do risco de demência de novo início. Estudos observacionais mostram um aumento de risco de aproximadamente 10% a 65%, com um aumento absoluto pequeno (1% a 5% em um período de 15 a 20 anos), resultando em um "número necessário para causar dano" (NNH) de 37.
  • Uso em Curto Prazo: O uso em curto prazo (menos de 4 semanas) da maioria dos anticolinérgicos para BH é provavelmente seguro para a maioria dos indivíduos. No entanto, o cloridrato de oxibutinina de liberação imediata (LI) demonstrou efeitos cognitivos deletérios em curto prazo, como impacto na memória, tempo de reação e atenção. Pacientes frágeis, idosos, com comprometimento cognitivo basal ou polifarmácia significativa podem ser mais vulneráveis.
  • Preferência por Agonistas Beta-3: Quando a terapia farmacológica é indicada para BH, a preferência deve ser dada aos agonistas beta-3 (mirabegron ou vibegron) antes dos anticolinérgicos, devido à sua eficácia equivalente e à ausência de preocupações fisiopatológicas conhecidas ou racionais que os liguem ao risco de demência.
  • Escolha de Anticolinérgicos: Se os anticolinérgicos forem indicados, o cloridrato de oxibutinina LI deve ser evitado. Alternativas com perfis neurofarmacológicos mais favoráveis, como formulações de liberação prolongada, trospium, darifenacina e fesoterodina, são preferíveis, pois apresentam menor penetração na barreira hematoencefálica.
  • Consideração do Risco Cognitivo em Todas as Populações: Os médicos devem considerar os potenciais riscos cognitivos dos anticolinérgicos em todas as populações de pacientes, independentemente da idade, ao prescrever uso crônico, devido à possibilidade de efeitos retardados (até 15-20 anos) e cumulativos.
  • Terapias Avançadas Precocemente: Deve-se considerar a progressão para terapias avançadas (toxina botulínica ou neuromodulação) mais cedo no algoritmo de tratamento da BH para pacientes apropriados, especialmente aqueles que não respondem à terapia comportamental e conservadora. Neuromodulação (tibial posterior ou sacral) e toxina botulínica mostraram ser mais eficazes que anticolinérgicos em alguns estudos.

Conclusão do Trabalho

A literatura atual sugere um pequeno, mas significativo, aumento do risco de demência com a exposição crônica a medicamentos anticolinérgicos para BH. Os potenciais danos devem ser ponderados em relação à potencial melhoria da qualidade de vida proporcionada pelo tratamento. Questões importantes permanecem sem resposta, como a ligação causal exata, o limiar de exposição para o desenvolvimento de demência e a segurança em populações específicas. Contudo, as evidências disponíveis apoiam o uso preferencial de outras terapias eficazes e de baixo risco, não anticolinérgicas, para a BH, e a consideração precoce de terapias avançadas.

Comentário Editorial

Este documento de consenso da SUFU oferece uma perspectiva crítica e altamente relevante para a prática urológica, especialmente na abordagem da bexiga hiperativa (BH). A discussão sobre os riscos cognitivos associados aos anticolinérgicos é um lembrete importante da complexidade de equilibrar a eficácia sintomática com a segurança a longo prazo, particularmente em uma população que tende a envelhecer.

A principal implicação prática é a necessidade de uma tomada de decisão compartilhada e informada com o paciente. A conscientização sobre o risco, mesmo que pequeno e demorado, de demência com o uso crônico de anticolinérgicos deve ser parte integrante da discussão terapêutica. A preferência por agonistas beta-3 como terapia de primeira linha farmacológica, e a escolha criteriosa de anticolinérgicos com perfis neurofarmacológicos mais favoráveis (evitando a oxibutinina de liberação imediata), tornam-se imperativas. Para pacientes que não respondem ou não toleram as terapias iniciais, o documento endossa a consideração precoce de terapias avançadas, como a toxina botulínica intravesical ou a neuromodulação sacral/tibial, que oferecem eficácia comprovada sem os riscos cognitivos associados aos anticolinérgicos.

As lacunas de conhecimento destacadas pelo documento apontam para várias direções de pesquisa futuras:
  • Mecanismo Causal e Dose-Resposta: É fundamental realizar estudos prospectivos para estabelecer se existe uma relação causal direta entre anticolinérgicos e demência, bem como para definir o limiar de dose e duração de exposição que representa maior risco.
  • Segurança em Populações Específicas: A falta de dados em populações mais jovens e com disfunção neurogênica do trato urinário inferior (DNTUI) é uma área crítica que precisa ser investigada. Compreender os efeitos cumulativos e a longo prazo nessas populações é essencial para orientar a prática clínica futura.
  • Novas Terapias e Biomarcadores: O desenvolvimento de novas terapias para BH que sejam eficazes e seguras do ponto de vista cognitivo é uma prioridade. Além disso, a identificação de biomarcadores que possam prever quais pacientes têm maior risco de desenvolver demência com o uso de anticolinérgicos permitiria uma personalização ainda maior do tratamento.

Este white paper serve como um guia essencial para a prática clínica, incentivando uma abordagem mais consciente e multifacetada no manejo da BH, com foco na otimização dos resultados clínicos e na minimização dos riscos a longo prazo para o paciente.

Referência

Zillioux J, Welk B, Suskind AM, Gormley EA, Goldman HB. SUFU white paper on overactive bladder anticholinergic medications and dementia risk. Neurourol Urodyn. 2022;41(8):1928-1933. doi:10.1002/nau.25037. PMID: 35984639.

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