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Eficácia do Diazepam Intravaginal para o Transtorno Hipertônico do Assoalho Pélvico: Uma Revisão Sistemática e Meta-análise

Autores do Artigo: 

Dana Sawan, Mersal Almanasif, Sarah Alharshan, Rasha Alanazi, Sadeen Fallatah, Wasan Alanazi e Nora Aloufi

Journal

Continence Reports

Data da publicação

Julho 2025

Autor do Resumo

Editor de Seção

  

Introdução

O transtorno hipertônico do assoalho pélvico (HTPFD) é uma condição neuromuscular caracterizada por espasmos involuntários dos músculos levantadores do ânus, frequentemente resultando em dor pélvica, dispareunia e disfunção vesical ou intestinal. Esta condição é comumente associada a síndromes como vulvodínia, cistite intersticial e dor miofascial pélvica. As opções de tratamento atuais, incluindo fisioterapia do assoalho pélvico e intervenções farmacológicas, possuem evidências limitadas que sustentam sua eficácia. O diazepam intravaginal tem sido cada vez mais utilizado como tratamento de segunda linha para a hipertonicidade do assoalho pélvico, devido à sua capacidade de induzir relaxamento muscular, com a vantagem de minimizar os efeitos adversos sistêmicos em comparação com a administração oral. No entanto, existem lacunas críticas no conhecimento sobre sua eficácia, dosagem ideal, duração do tratamento e segurança a longo prazo.

Objetivo

O objetivo deste estudo foi avaliar a eficácia dos supositórios de diazepam intravaginal na redução do tônus muscular do assoalho pélvico e no alívio dos sintomas associados em mulheres com HTPFD.

Desenho do estudo

Trata-se de uma revisão sistemática e meta-análise, conduzida de acordo com as diretrizes PRISMA (Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses) e registrada no PROSPERO.

Número de pacientes

Após a identificação inicial de 329 publicações e a remoção de duplicatas, 282 artigos foram considerados. Destes, apenas dois estudos (publicados em 2010 e 2013) atenderam aos critérios de inclusão e foram incorporados à meta-análise. Um dos estudos incluiu 14 participantes e o outro 35 participantes que completaram o acompanhamento.

Período de inclusão

A busca sistemática da literatura foi realizada em julho de 2024, abrangendo bases de dados como PubMed e Google Scholar.

Materiais e Métodos

O estudo utilizou uma metodologia rigorosa para identificar, selecionar e analisar a literatura existente. A busca foi realizada usando termos como "dor pélvica crônica", "diazepam", "disfunção do assoalho pélvico hipertônico", entre outros. Foram aplicados filtros para estudos em humanos e artigos completos, sem restrições de idioma ou ano de publicação. A seleção dos estudos foi guiada pela estrutura PICOS (População, Intervenção, Comparação, Desfechos e Desenho do Estudo).
A intervenção testada foi o diazepam intravaginal, um benzodiazepínico que age ligando-se aos receptores GABA-A, aumentando a condutância do íon cloreto e levando à hiperpolarização neuronal, o que diminui a excitabilidade e promove o relaxamento muscular. A administração intravaginal visa proporcionar alívio direcionado e minimizar efeitos sistêmicos.
Os critérios de inclusão para os estudos foram: mulheres diagnosticadas com HTPFD; administração de diazepam intravaginal como intervenção; comparação com placebo ou outros tratamentos padrão; desfechos primários de redução da dor (Escala Visual Analógica para Dor - EVA) e melhora da função sexual (Índice de Função Sexual Feminina); e desfechos secundários de efeitos adversos e relaxamento muscular do assoalho pélvico. Apenas ensaios clínicos randomizados (ECR), estudos de coorte e observacionais publicados como artigos completos foram incluídos.
Os critérios de exclusão para os estudos foram: pacientes com disfunção do assoalho pélvico devido a infecções, malignidades ou condições ginecológicas não relacionadas; estudos que não avaliassem especificamente o diazepam intravaginal ou o usassem para outras indicações; estudos sem grupo de comparação ou sem avaliações basais; e estudos que não relatassem os desfechos primários ou secundários. Tipos de estudo como revisões, relatórios de conferências, relatos de caso, comentários e editoriais foram excluídos.
A avaliação da qualidade e do risco de viés dos ECRs foi feita utilizando a Ferramenta de Avaliação de Risco de Viés da Colaboração Cochrane. A meta-análise foi realizada com software estatístico apropriado, avaliando a heterogeneidade com estatísticas I² e utilizando modelos de efeitos aleatórios onde a heterogeneidade era significativa.

 

Desfechos

Os desfechos primários considerados na revisão foram a redução da dor, medida pela Escala Visual Analógica (EVA), e a melhora na função sexual, medida pelo Female Sexual Function Index (FSFI). Os desfechos secundários incluíram a ocorrência de efeitos adversos e o relaxamento muscular do assoalho pélvico.

Resultados

A busca sistemática resultou na inclusão de apenas dois ensaios clínicos randomizados (ECRs).
1. Estudo de Crisp et al. (2013): Um ECR triplo-cego, que incluiu 14 mulheres, avaliou o uso de 10 mg de diazepam intravaginal por 28 dias. Os resultados não mostraram diferenças estatisticamente significativas nas leituras de eletromiografia (EMG) do assoalho pélvico em repouso ou nas pontuações subjetivas dos sintomas entre os grupos de diazepam e placebo. Ambos os grupos relataram melhorias modestas e não significativas na dor e na qualidade de vida. Nenhum efeito adverso foi relatado. Este estudo foi considerado subdimensionado, com uma amostra muito pequena.
2. Estudo de Holland et al. (2017): Um ECR duplo-cego, que inicialmente randomizou 49 participantes (35 completaram o estudo), administrou 10 mg de diazepam intravaginal conforme necessário, além de cuidados multimodais padrão. Após 4 semanas, as pontuações de dor na EVA permaneceram inalteradas no grupo diazepam, enquanto o grupo placebo mostrou uma redução de 12 mm (p > 0,05). Embora 56% do grupo diazepam e 44% do grupo placebo tenham relatado melhorias subjetivas, não houve diferenças estatisticamente significativas nos desfechos primários ou secundários. Efeitos adversos mínimos e comparáveis (dores de cabeça, sonolência e desconforto vaginal) foram observados em ambos os grupos. Este estudo teve uma taxa de atrito de 30%.
A meta-análise revelou que ambos os estudos incluídos foram subdimensionados e apresentaram altas taxas de atrito, o que limita a capacidade de detectar diferenças clinicamente significativas. A avaliação de viés de publicação, utilizando o teste de Egger (p=0,0121), sugeriu um risco estatisticamente significativo de viés de publicação.

Conclusão do Trabalho

A evidência atual é insuficiente para determinar a eficácia do diazepam intravaginal para o transtorno hipertônico do assoalho pélvico. Embora alguns pacientes tenham relatado melhora na qualidade de vida, isso pode ser atribuído ao efeito placebo. São necessários mais ensaios clínicos randomizados, maiores e bem controlados, para esclarecer seu papel terapêutico.

Comentário Editorial

Para a prática clínica, a principal mensagem é a cautela. Embora o diazepam intravaginal possa ser empregado, especialmente em casos refratários, é fundamental que o paciente seja informado sobre a limitação das evidências científicas atuais. Os modestos benefícios observados nos estudos existentes podem estar associados a efeitos placebo, o que não invalida a percepção de melhora do paciente, mas exige um olhar crítico sobre a intervenção farmacológica isolada. A associação com outras terapias, como a fisioterapia do assoalho pélvico, pode ser mais promissora, como sugerido por outros trabalhos citados na discussão, mas a contribuição específica do diazepam ainda permanece incerta nesses contextos combinados. É crucial monitorar rigorosamente os pacientes para efeitos adversos, mesmo que mínimos, e reavaliar continuamente a estratégia terapêutica.

As conclusões do estudo abrem portas para importantes direções futuras de pesquisa.
1. Ensaios Clínicos Robustos: Há uma necessidade urgente de ECRs de grande porte, bem delineados e com poder estatístico adequado, que comparem o diazepam intravaginal com placebo e com outras intervenções (como fisioterapia ou toxina botulínica). Esses estudos devem incluir períodos de acompanhamento mais longos e utilizar medidas de desfecho padronizadas para garantir que as melhorias observadas sejam clinicamente significativas e não apenas estatisticamente nulas.
2. Farmacocinética e Farmacodinâmica: A ausência de dados farmacocinéticos sobre a absorção sistêmica e o metabolismo do diazepam administrado intravaginalmente é uma lacuna crítica. Futuros estudos devem abordar essa questão para entender melhor o perfil de segurança e a exposição sistêmica real da droga quando usada por essa via.
3. Avaliação de Terapias Combinadas e Mecanismos de Ação: Explorar a eficácia do diazepam intravaginal em combinação com fisioterapia, biofeedback ou outras terapias funcionais pode ser promissor. Além disso, investigar como o diazepam, que atua no GABA, pode interagir com os componentes emocionais (ansiedade, estresse) da dor pélvica crônica pode fornecer insights sobre seu mecanismo de ação, especialmente considerando a complexa interação entre o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal e a dor.
Em suma, embora o diazepam intravaginal seja uma ferramenta em uso, a comunidade médica ainda carece de dados concretos para definir seu papel definitivo. A pesquisa futura deve focar em gerar evidências de alta qualidade para guiar a prática clínica de forma mais assertiva.

Referência

Sawan, D., Almanasif, M., Alharshan, S., Alanazi, R., Fallatah, S., Alanazi, W., & Aloufi, N. (2025). Efficacy of intra-vaginal diazepam for pelvic floor hypertonic disorder: A systematic review and meta-analysis. Continence Reports, 15, 100087.

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