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Belzutifano no tratamento sistêmico da doença de von Hippel-Lindau: seguimento de 50 meses do estudo LITESPARK-004

Autores do Artigo: 

Ramaprasad Srinivasan et al.

Journal

Lancet Oncology

Data da publicação

Abril 2025

Apoio educacional:

  

Introdução

Em abril de 2025 foi publicado na revista Lancet Oncology o estudo LITESPARK-004, que avaliou o inibidor de HIF-2α belzutifano em adultos com doença de von Hippel-Lindau associada a carcinoma de células renais e outras neoplasias (hemangioblastomas de sistema nervoso central e retina, além de tumores neuroendócrinos pancreáticos). A hipótese era que o bloqueio sustentado de HIF-2α poderia induzir respostas duradouras nesses tumores hereditários e, ao mesmo tempo, reduzir a necessidade de cirurgias repetidas ao longo da vida. O estudo mostrou atividade antitumoral prolongada com perfil de segurança manejável em quase 50 meses de seguimento, sugerindo um papel consolidado para o belzutifano como tratamento sistêmico nessa população. Confira abaixo mais detalhes do estudo:

Objetivo

Avaliar, com seguimento estendido para aproximadamente 50 meses, a atividade antitumoral e a segurança de longo prazo de belzutifano em pacientes com doença de von Hippel-Lindau associada a carcinoma de células renais e outras neoplasias relacionadas (hemangioblastomas de sistema nervoso central e retina, tumores neuroendócrinos pancreáticos), com ênfase em duração de resposta, sobrevida livre de progressão e necessidade de novas intervenções cirúrgicas.

Desenho do estudo

Estudo de fase 2, braço único, aberto, multicêntrico, conduzido em 11 centros na Dinamarca, França, Reino Unido e Estados Unidos. Todos os participantes receberam belzutifano de forma contínua até toxicidade inaceitável, progressão de doença ou decisão do paciente/investigador.

Número de pacientes

Foram incluídos 61 pacientes com doença de von Hippel-Lindau e carcinoma de células renais associado à síndrome.

Período de inclusão

Os pacientes foram recrutados entre 31 de maio de 2018 e 29 de março de 2019.

Materiais e Métodos

Os participantes receberam belzutifano 120 mg por via oral, uma vez ao dia. Eram permitidas reduções de dose para 80 mg e depois 40 mg uma vez ao dia em caso de toxicidade; o fármaco era descontinuado se 40 mg não fossem tolerados. Tratamento além da progressão radiológica podia ser mantido se houvesse benefício clínico, a critério do investigador e do patrocinador. O seguimento radiológico incluía tomografia computadorizada ou ressonância magnética de abdome, imagem de sistema nervoso central e avaliação oftalmológica, realizadas no baseline, na semana 13 e a cada 12 semanas por pelo menos 3 anos, passando depois a cada 24 semanas. As respostas em tumores sólidos foram avaliadas por comitê de revisão independente segundo RECIST 1.1; hemangioblastomas de sistema nervoso central com componente cístico tiveram sólido e cisto mensurados em conjunto; tumores neuroendócrinos pancreáticos foram definidos como lesões sólidas parenquimatosas sem comunicação com o ducto pancreático; hemangioblastomas de retina foram avaliados por fotografia de fundo de olho, com análise qualitativa de regressão ou aumento de fibrose e melhora de achados secundários. A segurança foi avaliada com exames clínicos, laboratoriais e eletrocardiograma em visitas frequentes nos primeiros meses e depois trimestrais.

Desfechos

O desfecho primário foi a taxa de resposta objetiva (resposta completa ou parcial confirmada) nos tumores renais associados à doença de von Hippel-Lindau, avaliada por comitê independente segundo RECIST 1.1.

Entre os desfechos secundários, destacam-se: duração de resposta, tempo até resposta, sobrevida livre de progressão e tempo até necessidade de cirurgia para os carcinomas renais; atividade em hemangioblastomas de sistema nervoso central e tumores neuroendócrinos pancreáticos (resposta objetiva, tempo até resposta, duração de resposta, sobrevida livre de progressão e tempo até cirurgia); melhora de hemangioblastomas de retina; além de perfil de segurança e farmacocinética do belzutifano.

Critérios de inclusão e exclusão mais relevantes

Foram incluídos adultos (≥18 anos) com diagnóstico de doença de von Hippel-Lindau confirmado por alteração germinativa em VHL, pelo menos um tumor renal mensurável, ausência de metástases à distância e performance status 0–1 pelo ECOG. Não eram elegíveis pacientes com tumor renal maior que 3 cm que exigisse cirurgia imediata, outras neoplasias que demandassem intervenção cirúrgica urgente, história de tratamento sistêmico prévio contra o câncer ou função hematológica, hepática e renal fora dos limites pré-definidos (tais como hemoglobina <10 g/dL, neutrófilos <1000/µL ou plaquetas <100.000/µL sem suporte recente, creatinina ≥2 vezes o limite superior da normalidade).

Resultados

Foram incluídos 61 pacientes, com mediana de idade de 41 anos, ligeiro predomínio de performance status 0 e alta carga prévia de doença: 82% tinham hemangioblastomas de sistema nervoso central, 36% tumores neuroendócrinos pancreáticos e 23% hemangioblastomas de retina, e 97% já haviam sido submetidos a pelo menos uma cirurgia relacionada à doença de von Hippel-Lindau.

Com mediana de seguimento de cerca de 50 meses, a taxa de resposta objetiva nos tumores renais foi de 67% (11% respostas completas), com mediana de tempo até resposta de 11,1 meses e duração de resposta ainda não alcançada; a sobrevida livre de progressão mediana foi de 49,8 meses, com aproximadamente 79% dos pacientes livres de progressão em 42 meses. Houve resposta objetiva em 48% dos pacientes com hemangioblastomas de sistema nervoso central, em 91% daqueles com tumores neuroendócrinos pancreáticos (metade com resposta completa) e melhora em 93% dos pacientes com hemangioblastomas de retina.

Nos quatro anos anteriores ao estudo, 46 pacientes haviam realizado 86 procedimentos cirúrgicos ou radioterápicos para tumores relacionados à doença de von Hippel-Lindau, número que caiu para 18 procedimentos em 16 pacientes após o início do belzutifan, indicando redução relevante da necessidade de intervenções.

Os eventos adversos relacionados mais frequentes foram anemia (89%) e fadiga (66%); eventos grau 3 ocorreram em 18% dos pacientes, principalmente anemia (11%), sem eventos grau 4 ou 5 atribuídos ao tratamento e sem novos sinais de toxicidade além do perfil já conhecido do fármaco. Reduções de dose devido a eventos adversos relacionados ao tratamento foram necessárias em apenas 16% dos casos.

Conclusão do Trabalho

O seguimento de aproximadamente 50 meses do LITESPARK-004 confirma que o belzutifano produz respostas frequentes e duradouras em tumores renais e em outras neoplasias associadas à doença de von Hippel-Lindau, com estabilização ou regressão sustentada do volume tumoral e baixa taxa de eventos adversos graves relacionados ao tratamento. A redução expressiva na necessidade de procedimentos cirúrgicos ao longo do estudo sugere que o uso prolongado de belzutifan pode postergar ou evitar cirurgias em múltiplos órgãos, sem novos sinais de toxicidade além daqueles já descritos.

Comentário Editorial

O seguimento estendido do LITESPARK-004 reforça o belzutifano como opção sistêmica central na doença de von Hippel-Lindau, mostrando não apenas manutenção, mas incremento das taxas de resposta com o passar do tempo. No relato inicial do estudo, publicado no New England Journal of Medicine com mediana de seguimento de cerca de 22 meses, a taxa de resposta objetiva em carcinoma de células renais associado à doença de von Hippel-Lindau foi de 49%; já na análise atual, com aproximadamente 50 meses de seguimento, essa taxa sobe para 67%, com duração de resposta ainda não alcançada. Análises específicas de hemangioblastomas de sistema nervoso central também mostram aumento da taxa de resposta com seguimento mais prolongado, sugerindo recrutamento tardio de respostas em parte das lesões. Em tumores neuroendócrinos pancreáticos, a taxa de resposta permanece muito elevada, com incremento na proporção de respostas completas à medida que o tempo de exposição se alonga.

Por outro lado, é importante reconhecer as limitações do estudo: trata-se de estudo de fase 2, braço único, com número relativamente pequeno de pacientes, população selecionada (maioria com performance 0 e tumores renais menores que 3 cm) e sem comparação formal com a estratégia tradicional baseada em vigilância e cirurgias seriadas. Além disso, não há dados sistemáticos de qualidade de vida e o uso crônico de uma droga alvo-específica com custo elevado exige análise de custo-efetividade e discussão de acesso, particularmente em sistemas de saúde como o brasileiro.

Ainda assim, o conjunto de evidências aponta o belzutifano como uma ferramenta importante para pacientes com síndrome VHL, de modo a reduzir intervenções cirúrgicas ao longo da vida, desde que com monitorização cuidadosa de anemia e hipóxia.

Referência

Srinivasan R, Iliopoulos O, Beckermann KE, Narayan V, Maughan BL, Oudard S, et al. Belzutifan for von Hippel-Lindau disease-associated renal cell carcinoma and other neoplasms (LITESPARK-004): 50 months follow-up from a single-arm, phase 2 study. Lancet Oncology. Published online April 12, 2025. doi:10.1016/S1470-2045(25)00099-3.

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