CaboPoint: cabozantinibe em segunda linha após combinações com imunoterapia em carcinoma de células renais metastático
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Data da publicação
Introdução
Em setembro de 2025 foi publicado na revista European Urology o estudo CaboPoint, que avaliou cabozantinibe como tratamento de segunda linha em pacientes com carcinoma de células renais localmente avançado ou metastático após progressão em combinações de inibidores de checkpoint imunológico, seja ipilimumabe mais nivolumabe ou esquemas que associam imunoterapia a terapias alvo de fator de crescimento endotelial vascular. A hipótese era de que cabozantinibe, ao inibir simultaneamente vias de MET e VEGF, proporcionaria uma taxa de resposta objetiva superior ao patamar histórico de 10% observado com everolimo na era pré-imunoterapia, estabelecendo um padrão de referência para a sequência terapêutica na era das combinações com imunoterapia. O estudo demonstrou taxas de resposta e tempos de controle de doença consistentes com essa premissa, sem novos sinais de toxicidade relevantes.
Objetivo
Avaliar a eficácia e segurança de cabozantinibe em segunda linha em pacientes com carcinoma de células renais localmente avançado ou metastático após progressão a combinações baseadas em inibidores de checkpoint imunológico.
Desenho do estudo
Estudo de fase 2, multicêntrico, aberto, europeu, com dois coortes paralelos: coorte A para pacientes previamente tratados com ipilimumabe mais nivolumabe e coorte B para pacientes tratados com imunoterapia combinada a terapia alvo de fator de crescimento endotelial vascular (axitinibe mais avelumabe ou axitinibe mais pembrolizumabe).
Número de pacientes
Foram incluídos 127 pacientes:
- Coorte A: n=85
- Coorte B: n=42
Período de inclusão
Os pacientes foram incluídos entre 8 de janeiro de 2020 e 13 de novembro de 2023, em 40 centros de sete países europeus.
Materiais e Métodos
Os pacientes receberam cabozantinibe 60 mg por dia por via oral, em regime contínuo. Eram permitidas reduções de dose para 40 mg ou 20 mg ao dia para manejo de toxicidade. O tratamento era mantido até progressão radiológica, toxicidade inaceitável, retirada de consentimento ou término do estudo (18 meses após o último paciente iniciar cabozantinibe). A resposta tumoral foi avaliada por tomografia computadorizada ou ressonância magnética de acordo com RECIST 1.1, com revisão central independente e avaliação local do investigador. A qualidade de vida relacionada à doença foi mensurada pelo questionário FKSI-DRS, e eventos adversos foram classificados segundo CTCAE versão 5.0.
Desfechos
O desfecho primário foi a taxa de resposta objetiva por revisão central independente na coorte A, testada contra um limiar de 10% de resposta, baseado em dados históricos com everolimo.
Desfechos secundários incluíram taxa de resposta objetiva por revisão central na coorte B, taxa de resposta por avaliação do investigador, sobrevida livre de progressão, sobrevida global, tempo até resposta, duração de resposta, taxa de controle de doença, qualidade de vida e segurança.
Critérios de inclusão e exclusão mais relevantes
Foram elegíveis adultos com carcinoma de células renais com componente de células claras, localmente avançado irressecável ou metastático, com progressão radiográfica após primeira linha com ipilimumabe mais nivolumabe (coorte A) ou combinação de inibidor de checkpoint e terapia alvo de fator de crescimento endotelial vascular (coorte B). Era necessária doença mensurável segundo RECIST 1.1, desempenho funcional Eastern Cooperative Oncology Group 0–1, função orgânica adequada e possibilidade de uso de cabozantinibe em segunda linha. Metástases cerebrais tratadas e estáveis podiam ser incluídas conforme julgamento do investigador.
Resultados
A mediana de seguimento foi de 19,3 meses. Os pacientes tinham idade média de 64,2 anos, 75,6% eram homens e cerca de 60% apresentavam doença metastática já ao diagnóstico. A maioria dos pacientes avaliáveis era de risco intermediário ou pobre pelo IMDC. Aproximadamente dois terços tinham sido submetidos à nefrectomia prévia. No início de cabozantinibe, os sítios de metástase mais frequentes eram pulmão (70,6%), linfonodos (43,7%), osso (28,6%) e fígado (17,5%); cerca de 40% apresentavam três ou mais sítios de metástase. O tratamento de primeira linha havia sido relativamente curto, com mediana de 5,0 meses na coorte tratada previamente com ipilimumabe mais nivolumabe e 8,6 meses naquelas expostas a combinações com terapia alvo de fator de crescimento endotelial vascular.
Na análise central, a taxa de resposta objetiva foi de 40,5% na coorte A (32 de 79 pacientes) e 27,5% na coorte B (11 de 40), com taxa global de 36,1%; o objetivo primário foi atingido com significância estatística frente ao limiar de 10%. As taxas de controle de doença superaram 80% em ambas as coortes.
A mediana de sobrevida livre de progressão foi de 10,9 meses após ipilimumabe mais nivolumabe e 8,3 meses após combinações com terapia alvo, enquanto a sobrevida global mediana foi semelhante entre as coortes, em torno de 24 meses.
Em termos de segurança, praticamente todos os pacientes apresentaram algum evento adverso, com eventos graus 3–4 em 75,6%, principalmente hipertensão, diarreia e embolia pulmonar (n=4). Diarreia, redução do apetite, estomatite, fadiga e síndrome mão–pé foram os eventos clínicos mais frequentes, geralmente manejáveis com interrupções (84,3% dos pacientes) e reduções de dose (29,1%), com descontinuação definitiva por toxicidade em menos de 20% e ausência de óbitos relacionados ao tratamento
Conclusão do Trabalho
O CaboPoint demonstra que cabozantinibe mantém atividade relevante em segunda linha na era das combinações com imunoterapia, especialmente após ipilimumabe mais nivolumabe, com taxas de resposta e tempos de controle de doença compatíveis com o uso como padrão terapêutico nesse cenário. O perfil de segurança foi consistente com a experiência prévia com cabozantinibe, sem novos sinais de toxicidade, e o estudo fornece um parâmetro contemporâneo para comparação com futuras estratégias de segunda linha em carcinoma de células renais avançado.
Comentário Editorial
Na prática clínica, a sequência terapêutica após progressão em combinações de imunoterapia com ou sem terapia alvo de fator de crescimento endotelial vascular permanece uma questão central na condução do carcinoma de células renais. Os dados do CaboPoint reforçam o uso de cabozantinibe como padrão de segunda linha após essas combinações, em linha com os braços controle com cabozantinibe monoterapia dos estudos CONTACT-03 e CANTATA, que não mostraram benefício claro da adição de atezolizumabe ou telaglenastate ao inibidor de tirosina-quinase. O padrão de maior taxa de resposta após ipilimumabe mais nivolumabe, comparado à situação em que o paciente já foi exposto a outro inibidor de fator de crescimento endotelial vascular em primeira linha, é consistente com estudos observacionais como o estudo CARINA, que sugerem alguma redução de eficácia quando cabozantinibe é utilizado depois de outra terapia alvo, mas sem impacto evidente em sobrevida global.
Do ponto de vista prático, os resultados apoiam a escolha de cabozantinibe como opção de referência em segunda linha após combinações com imunoterapia, com atenção ao manejo precoce de toxicidades gastrointestinais, hipertensão e síndrome mão–pé para manter a dose em um patamar eficaz. As limitações do estudo — desenho aberto, ausência de braço comparador e amostra menor do que o planejado, com dados incompletos de risco pelo consórcio internacional — indicam que futuras comparações randomizadas, como o estudo LITESPARK-011 que compara cabozantinibe com belzutifano mais lenvatinibe, serão importantes para refinar a escolha entre monoterapia com inibidor de tirosina-quinase e novas combinações nesse cenário.
Referência
Albiges L, Powles T, Sharma A, Venugopal B, Schmidinger M, Taguieva-Pioger N, et al. CaboPoint: A Phase 2 Study of Second-line Cabozantinib After Checkpoint Inhibitor–based Combination Therapy in Patients with Metastatic Renal Cell Carcinoma. European Urology. Published online September 29, 2025. doi:10.1016/j.eururo.2025.07.018

